António Francisco Lisboa
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Domingos Tavares
ISBN 9789729901997
Dafne
Capa mole, 140 pp, 15,0×22,5 cm
Portuguese
2006
In stock
Em tempo de euforia migratória estimulada pela miragem do ouro do Brasil, muitos portugueses dos ofícios da construção optaram pela aventura, na esperança de melhores dias para as suas vidas. Não partiam de mãos vazias. A primeira ferramenta de um artífice inteligente é o seu caderno de modelos, memória segura da aprendizagem possível, guia para o entusiasmo de fazer bem para ganhar estatuto na profissão.
António Francisco Lisboa nasceu no Brasil, filho natural de um desses emigrantes. Herdou do pai o jeito para a talha e o sentido da criação das formas. Inteligente, teria até frequentado lições de latim, e lia a Bíblia. Com perto de quarenta anos, na força da vida e já senhor de um notável prestígio de artista, sofreu de uma doença que lhe foi destruindo o corpo ao longo dos restantes quase quarenta que ainda suportou, até que se finou paralítico e cego.
Interrogamo-nos sobre como foi possível a um homem que nunca viajou para o outro lado do Atlântico, nem frequentou a sabedoria dos tratados da arquitectura europeia, atingir um tal grau de refinamento como geómetra, dominador dos princípios mais subtis da composição das formas barrocas, com um nível de encanto que o aproxima mais da linha de Borromini do que qualquer outro arquitecto, por mais culto e europeu que procuremos.
Em São Francisco de Ouro Preto somos acometidos da mesma emoção estética com que nos invade a obra de Borromini, nessa linha do tratamento das axialidades contrárias sob matriz luminosa, que o autor romano aceitava ter origem nas experiências medievas da sua primeira aprendizagem. A concepção do espaço interno na arquitectura do Aleijadinho é mais determinada pela sensibilidade pessoal com que retoca os esquemas que lhe são fornecidos pelas formas da evolução local, ou pelas notícias gráficas de arquitecturas distantes, do que por uma formação escolástica ou fruto de transmissão organizada de um código de bem-fazer.
Nos confins da terra do ouro, escondido muito para lá do oceano, nas serranias de Minas Gerais, vamos encontrar a figura do arquitecto descrita por Alberti na pessoa de António Francisco, utilizando o desenho como traço de rigor para a obra que o construtor executa seguindo a invenção formal do autor do risco. Repetindo de modo inconsciente os passos que sabemos terem sido os dos primeiros arquitectos do Renascimento florentino, cinzeladores da prata que modelaram a forma na sua imaginação para ser transposta para o mármore.